11.09.2024

Brigadas comunitárias: a linha de frente contra incêndios florestais no Brasil

Apoio do Fundo Casa Socioambiental fortalece brigadas indígenas e voluntárias no combate aos incêndios florestais, integrando conhecimento tradicional e tecnologia para preservar ecossistemas e mitigar os impactos das mudanças climáticas.

O aumento dos incêndios florestais no Brasil, agravado pelas mudanças climáticas e práticas inadequadas de uso da terra, tem colocado as brigadas comunitárias na linha de frente das ações de combate e prevenção. 

Compostas por voluntários e lideranças locais, essas brigadas utilizam uma combinação de conhecimento ancestral e técnicas modernas para enfrentar os incêndios que ameaçam ecossistemas inteiros e a vida de milhares de pessoas. 

Elas desempenham um papel importante na detecção, prevenção e resposta imediata aos incêndios, muitas vezes sendo as primeiras a atuar em situações de emergência devido ao seu conhecimento local e proximidade com os territórios afetados.

De acordo com o Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), cerca de 200 brigadas atuam em todo o Brasil, compostas por membros das próprias comunidades. Essas brigadas têm desempenhado um papel fundamental na proteção de florestas, territórios indígenas e áreas vulneráveis.

A recente criação da Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo (PNMIF), por meio da Lei 14.944/2024, reforça essa atuação. A política tem como objetivo promover a articulação entre sociedade civil e governo para aprimorar a prevenção e resposta a incêndios, envolvendo diretamente as brigadas comunitárias.

Brigadas Indígenas de Roraima: sabedoria ancestral e tecnologia

Em Roraima, as brigadas indígenas têm sido uma linha de defesa fundamental contra os incêndios florestais, os quais ameaçam o Lavrado, um ecossistema único em meio a Amazônia, semelhante ao Cerrado, onde o fogo se propaga com muita facilidade. 

Segundo Sinéia Wapichana, coordenadora do Comitê Indígena de Mudança Climática (CINC) e do Departamento de Gestão Territorial, Ambiental e Mudanças Climáticas do Conselho Indígena de Roraima (CIR), a combinação do conhecimento tradicional com tecnologias modernas tem permitido uma resposta eficaz ao combate e a prevenção dos incêndios florestais.

Distribuição das Brigadas Indígenas em Roraima. Fonte: CIR

“Em 1998, tivemos uma grande queimada em Roraima, e a partir disso começamos a trabalhar e constituir brigadas indígenas para unir o conhecimento técnico ao tradicional”, explica Sinéia. 

Desde então, o CIR tem capacitado brigadistas indígenas, tanto homens quanto mulheres, para atuar em situações de emergência e prevenção. Além do treinamento, as brigadas utilizam tecnologias como drones e sistemas de monitoramento da qualidade do ar para auxiliar no combate aos incêndios. “O uso de drones, por exemplo, tem sido essencial para identificar focos de calor e direcionar as brigadas em campo”, acrescentou Sinéia. 

Sinéia Wapichana é coordenadora do Comitê Indígena de Mudança Climática (CINC) e do Departamento de Gestão Territorial, Ambiental e Mudanças Climáticas do Conselho Indígena de Roraima (CIR) e importante líder indígena e ativista ambiental. Foto: Arquivo da Embaixada dos Estados Unidos no Brasil.

A implementação de tecnologias como o “Starlink” tem permitido uma comunicação eficiente entre as brigadas e as bases operacionais, facilitando a logística e o monitoramento remoto.

Um dos maiores desafios enfrentados pelas brigadas é o combate a incêndios que têm origem fora das terras indígenas. “Este ano, 70% dos incêndios vieram de fora dos nossos territórios”, diz Sinéia. 

O uso de drones é parte importante da estratégia de monitoramento e combate de incêndios florestais. Foto: Acervo CIR

A importância das brigadas comunitárias se estende também à prevenção. Sinéia mencionou que o trabalho preventivo é feito com base em planos de vida elaborados pelas comunidades, que incluem práticas de ordenamento territorial e uso sustentável do fogo. “A prevenção é uma das nossas prioridades, e é aí que o conhecimento tradicional dos povos indígenas se mostra extremamente valioso”, disse.

Brigada Voluntária de Cavalcante (BRIVAC): defesa no Cerrado

Na região da Chapada dos Veadeiros, em Goiás, a Brigada Voluntária Ambiental de Cavalcante (BRIVAC) tem desempenhado um papel fundamental na proteção do bioma Cerrado contra os incêndios. Sob a presidência de Rafael Drumond, a brigada tem capacitado comunidades locais, como o Quilombo São Domingos, para responder rapidamente aos incêndios e desenvolver estratégias de manejo sustentável do fogo.

Clique para assistir o vídeo “Apoio contínuo a brigadas comunitárias e voluntárias”, uma iniciativa do Fundo Casa em parceria com a Rede Comuá para o Mês da Filantropia que Transforma.

“A BRIVAC tomou a iniciativa de fortalecer as brigadas comunitárias da região, capacitando-as para o combate inicial aos incêndios,” explica Rafael Drumond. 

Além do combate direto aos incêndios, as brigadas comunitárias também desempenham um papel importante na educação ambiental e na restauração de áreas afetadas pelo fogo. 

“As brigadas comunitárias poderão contribuir muito com a redução dos incêndios na região e, ao mesmo tempo, realizar ações de educação ambiental e a restauração de áreas degradadas.” Rafael Drumond

A BRIVAC realiza ações de treinamento e formação de brigadas voluntárias em regiões da Chapada dos Veadeiros, abordando o combate, manejo integrado do fogo e educação ambiental. Foto: Arquivo BRIVAC

Um dos principais focos da BRIVAC tem sido a recuperação de nascentes que foram comprometidas pelos incêndios. “Identificamos nascentes comprometidas após a passagem do fogo, e estamos trabalhando na recuperação dessas áreas”, explica o presidente da BRIVAC. 

Essa atuação integrada fortalece o território e protege tanto a biodiversidade quanto os modos de vida locais. 

O Fundo Casa e o apoio  às Brigadas

O trabalho das brigadas comunitárias e voluntárias é reconhecido por sua eficácia, mas também enfrenta desafios. A falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) adequados é uma das principais dificuldades. O apoio de organizações como o Fundo Casa Socioambiental tem sido fundamental para suprir essa necessidade. 

Segundo Sinéia Wapichana, “os EPIs são essenciais para garantir a segurança dos brigadistas, e nós agradecemos o apoio que recebemos para equipar adequadamente nossas brigadas”. 

O Fundo Casa tem sido uma peça chave no fortalecimento das brigadas comunitárias, oferecendo apoio financeiro e logístico para que essas iniciativas prosperem. 

Mulheres Apinajé, da primeira brigada voluntária indígena feminina da Amazônia, participam da primeira atividade de queima prescita da temporada de fogo do ano de 2023 na Terra Indígena Apinajé. Foto: Bruno Kelly

Beatriz Roseiro, gestora de programas, destaca que a parceria com as brigadas busca integrar o conhecimento das comunidades locais com soluções tecnológicas e estratégias de longo prazo. “Estamos comprometidos em garantir que essas brigadas tenham os recursos necessários para enfrentar os desafios dos incêndios florestais e proteger seus territórios.”

O apoio do Fundo Casa às brigadas de incêndio começou a ganhar forma devido à necessidade urgente de recursos para combater incêndios que já haviam se alastrado. Beatriz Roseiro explica que, inicialmente, o suporte estava restrito a suprimentos e logística, o que limitava a capacidade de realizar ações estruturantes e de longo prazo.

“Observamos que esses recursos tão necessários eram consumidos rapidamente por suprimentos e logística, permitindo a atuação daqueles que já estavam treinados e equipados para atuar no combate a incêndios, mas inviabilizando ações estruturantes e de planejamento,” afirma Beatriz Roseiro.

Para superar essas limitações, o Fundo Casa lançou, em 2021, a chamada de projetos intitulada “Apoio a Grupos de Base no Enfrentamento de Emergências Climáticas Provocadas a partir dos Incêndios Florestais”. Desde então, o Fundo Casa tem oferecido suporte estruturante às brigadas voluntárias e comunitárias, associações e comunidades de base, visando uma abordagem planejada e eficaz no combate e prevenção de incêndios.

O apoio do Fundo Casa é dividido em três linhas principais. A primeira é a estruturação e fortalecimento das brigadas voluntárias, que inclui o fortalecimento das capacidades, reestruturação e suporte logístico. Beatriz Roseiro ressalta que “as brigadas comunitárias são a primeira resposta aos incêndios florestais, pois os moradores locais conhecem melhor seus territórios”. 

Treinamento na Aldeia Mãe Terra, Terra Indígena Cachoeirinha, no Mato Grosso do Sul. A comunidade foi contemplada pelo apoio do Fundo Casa em Parceria com a ECOA em 2022. Foto: Victor Hugo Sanches

A segunda linha é o manejo integrado do fogo, que envolve atividades de prevenção, monitoramento e controle de incêndios, além de treinamentos e reflorestamento. A terceira linha é a mobilização e engajamento, que busca ampliar o envolvimento comunitário na prevenção de incêndios e criar canais para denúncias.

Até o momento, o Fundo Casa apoiou 145 projetos voltados ao combate de incêndios florestais, com um investimento de mais de R$6 milhões. As ações têm ajudado a prevenir incêndios e empoderando comunidades locais como protagonistas na proteção de seus territórios.

Fundo Casa Socioambiental lança chamadas para apoiar brigadas

O Fundo Casa lançou no início de setembro de 2024 uma chamada emergencial para apoiar até 30 projetos com R$20 mil cada. O objetivo foi dar um reforço imediato a brigadas que estão em combate ainda neste momento.

Agora, uma nova chamada se encontra aberta com o objetivo de promover apoios estruturantes a longo prazo, fortalecendo a atuação de brigadas em todo Brasil. Serão apoiados até 30 projetos com R$60 mil cada. Clique aqui e saiba mais.



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