22.11.2023

Encontro inédito reúne mulheres indígenas brigadistas florestais em uma jornada de coletividade e conservação da natureza

Cerca de 50 mulheres brigadistas florestais de quatro povos indígenas — Apinajé, Gavião, Krikati e Xerente — estiveram reunidas durante três dias na aldeia São José, na Terra Indígena Krikati, no Maranhão, de 7 a 9 de novembro, trocando experiências sobre manejo integrado do fogo, educação ambiental e iniciativas de prevenção a incêndios em estados da Amazônia Legal.

As brigadas voluntárias destas mulheres indígenas começaram a ser formadas em diferentes períodos e agora elas puderam se encontrar e sentir a força coletiva feminina, que trazem também o conhecimento ancestral do uso cultural e tradicional do fogo em suas terras, sendo um diferencial nas ações de educação ambiental, um dos pilares para a prevenção de incêndios, indo além apenas do apoio ao combate. “Nós tínhamos 42 mulheres na formação da brigada voluntária. Para não deixar nenhuma de fora, nos organizamos em três frentes: a do sistema agroflorestal, da educação ambiental e do combate [aos incêndios]. Assim todas podem somar forças nesta luta”, conta Cida Apinajé, uma das líderes da brigada voluntária Apinajé.

Mulheres da Brigada Apinajé no Encontro de Brigadistas Florestais | Foto: Marizilda Cruppe/USAID

O encontro também conectou as mulheres umas às outras, mostrando que elas não estão sozinhas neste sonho. “Eu via as Xerente na internet contando sobre a brigada delas. Isso nos inspirou. Eu era coordenadora da AMIMA (Associação das Mulheres Indígenas do Maranhão) e abracei a causa. Esse encontro de mulheres é um avanço nesta luta para somar aos homens, trabalharmos de igual para igual. Estamos trabalhando cada vez mais para fortalecer a luta das mulheres indígenas”, relata Maria Helena Gavião, vice-coordenadora da COAPIMA (Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão).

A relevância deste evento se dá no contexto da emergência climática e da importância da manutenção da vegetação nativa. Contudo, no universo das brigadas florestais indígenas, assim como em outros tipos de brigadas florestais, mulheres indígenas ainda enfrentam desafios para inclusão de gênero nas estratégias do manejo integrado do fogo. “E foi difícil porque muitas mulheres tiveram que enfrentar os maridos,  por eles não entenderem muitas vezes que é importante ir mostrar o trabalho e conversar com outras mulheres, como começamos a fazer neste encontro”, diz Maria Helena Gavião. A proposta é tornar o encontro anual e expandi-lo para agregar outros povos indígenas e grupos de mulheres comunitárias tradicionais, como quilombolas e extrativistas. “A gente não quer parar por aqui, queremos espalhar para outras terras indígenas”, finaliza.

Conexões inspiradoras

Coletividade, parceria, troca de experiências e mulheres inspiradoras estiveram no foco das rodas de conversa. Além de sentirem esse pertencimento, também planejaram os próximos passos. Durante o encerramento, as brigadas de cada povo indígena fizeram um planejamento de ações para 2024. Foram incluídas desde propostas de formação e capacitação, construção de viveiros até a criação de material didático na língua de cada povo. ​​“As mulheres têm um trabalho de prevenção e de educação ambiental. Quando vamos às escolas falar para as crianças sobre nossa rotina e como devemos cuidar do meio ambiente elas ficam motivadas. Ao contar as histórias, já ouvi de algumas que elas querem ser como nós quando crescerem. Isso é emocionante”, explica Ana Shelley Xerente, brigadista indígena contratada pelo Prevfogo/Ibama, que começou na brigada voluntária feminina.

Atividade desenvolvida no Encontro de Mulheres Indígenas Brigadistas Florestais, na Aldeia São José, do povo Krikati, município de Montes Altos, Maranhão. | Foto Marizilda Cruppe/ USAID.

Rose Krikati, a mais jovem da brigada, com 18 anos, conta que já desde quando tinha 14 anos começou a se envolver nas reuniões. Ela conta que o trabalho de prevenção e de educação ambiental, está fazendo os animais e os frutos que já não tinham mais na aldeia, começarem a aparecer novamente. “Eu quero lutar pelo meu povo, pelos povos indígenas do Brasil. Nós mulheres brigadistas voluntárias nos sentimos fortes, inspiradas, com um olhar amplo, para garantir o futuro das outras gerações também. É um orgulho para nós estarmos ocupando um lugar onde queremos estar”.

Também estiveram presentes mulheres brigadistas representantes de instituições como Funai e Prevfogo/Ibama na prevenção e controle de incêndios florestais, trazendo o panorama dos avanços e desafios da participação das mulheres no combate e prevenção de incêndios florestais. “A gente vê claramente que a prevenção de incêndios é cada vez mais fundamental e eficaz do que agir só quando os incêndios já estão acontecendo. As mulheres podem somar muito ao trabalho das brigadas oficiais trabalhando nestas frentes”, reforça Paula Mochel, chefe da Divisão de Prevenção do Prevfogo/Ibama. Segundo a instituição, das 94 mulheres brigadistas hoje no país, nas brigadas do Prevfogo/Ibama, 32 são indígenas. O objetivo é aumentar estes números e as brigadas voluntárias são um caminho para que as mulheres indígenas alcancem posições nas brigadas oficiais.

Um encontro como esse começa a ser organizado muitos meses antes de ele acontecer de fato, por meio de alianças, parcerias, que apoiam em trilhas de aprendizagem, treinamentos e capacitações de todas as mulheres envolvidas. O Fundo Casa Socioambiental, por exemplo, conta com editais de apoio a brigadas voluntárias, sendo a das Apinajé uma das selecionadas em 2022. O Serviço Florestal dos Estados Unidos (USFS), programa do Brasil, com apoio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), tem trabalhado a longo prazo nas formações das brigadas junto ao Prevfogo/Ibama e Funai, como os treinamentos das Brigadas Xerente e Apinajé. Jayleen Vera, coordenadora geral do USFS no Brasil, destaca o evento como um marco importante na luta destas mulheres e na proteção dos territórios: “Ouvimos exemplos excelentes de resultados de redução do impacto dos incêndios florestais, de engajamento das comunidades. Essas mulheres indígenas estão trazendo um novo olhar que conecta as anciãs, os anciãos, as crianças, as escolas em esforços para trazer para o chão o manejo integrado do fogo. Então o nosso papel como instituição parceira é impulsionar ainda mais isso”.

O 1º Encontro de Mulheres Indígenas Brigadistas Florestais foi realizado pelos Grupos de Mulheres Indígenas Brigadistas Apinajé, Awkê/Xerente, Gavião e Krikati, Articulação das Mulheres Indígenas do Maranhão (AMIMA), Coordenação das Organizações e Articulações dos Povos Indígenas do Maranhão (COAPIMA), Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo) do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Serviço Florestal dos Estados Unidos (USFS), com apoio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID). Conta também com a parceria do Fundo Casa Socioambiental.

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